"Preparar,
pelo trabalho, a volta para casa, entre todas as coisas do mundo, é a que tem
mais densidade de ventura. Pode o mundo moderno aviltar o trabalho, fazendo do
homem uma pura máquina para o serviço de uma babilônia; pode semear obstáculos
sem fim entre a mesa do funcionário e aquela soleira de porta onde ele tira do
bolso uma chave encantada e toma posse de um reino; podem os pregadores
anunciar um regime ideal, em que a casa é um prolongamento da repartição, uma
máquina de morar cujos objetos pertencem a todos (o que equivale a dizer que
não pertencem a ninguém), e onde o próprio gato receberá um nome oficial; podem
socializar, burocratizar, centralizar; e minar os alicerces da família; e
arrebatar as crianças para as chocadeiras técnicas onde se ensina que foi um
dentista ou um bacharel que fizeram o mundo; debalde farão tudo isso com o
auxílio de todos os demônios: o homem não esquece o paraíso que perdeu. Não
esquece que seu primeiro pai foi um rico proprietário rural, que dava ele mesmo
os nomes aos bichos e usava fartamente, e sem pena, os frutos de sua
terra."
*****
Gustavo
CORÇÃO. Três alqueires e uma vaca, 4. ed., Rio de Janeiro: Agir, 1955, p.
234-235.
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