domingo, 13 de janeiro de 2019

RETRATO, NA VOZ DE JOÃO VILLARET


Ele era da raça dos que suportam
Todo o peso da vida,
Era da dos que não se queixam
Dos que sorriem diante do destino adverso.

Viveu em silêncio grandes horas amargas
E ninguém conheceu as devastações,
O efeito dos golpes que lhe foram vibrados.

As sua ruínas, os seus deuses mutilados,
Os túmulos que estavam nele
Ninguém desvendou,
Tudo ficou escondido,
Tudo ficou defendido
Pela sua máscara tranquila.

No entanto ninguém amou
Mais profundamente do que ele amou,
E ninguém terá recolhido maior melancolia
E maior incompreensão
Do amor.
Ninguém desejou mais a companhia dos seus semelhantes,
Ninguém teve mais necessidade do calor amigo,
Do apoio, do aplauso, da solidariedade humana.
No entanto - sua vida se consumiu na solidão, no desamparo e na indiferença.

A amargura não fermentou sua alma,
O ressentimento não dominou jamais sua visão simples das coisas,
Ele era da raça dos heróis obscuros.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

DEUS PRECISA DOS SANTOS, E ESPECIALMENTE DE MARIA


"Podemos dizer que Deus precisa dos santos, e especialmente de Maria, porque nessas criaturas temos uma espécie de misericórdia que não podemos ter no próprio Deus: uma misericórdia que, além de vir do amor, vem da própria miséria. Por puríssima que seja, Maria é criatura, e como tal é miserável. E é por isto – ouso dizer – que Deus precisa de Maria e dos santos para o exercício de sua misericórdia e para o contato salvador com nossa miséria.
Todos nós sabemos que Deus e o pecado são incompatíveis; mas também sabemos que as mais belas tradições de nossa história revelam um como que privilégio dos pecadores, ou uma inconcebível espécie de atração de Deus por nossa miséria. Quase diríamos que a marca do cristianismo é a de uma atrevida predileção pelo pecador. Como pode ser isto? Os evangelhos contam o amor de Jesus por Madalena, e nos apresentam a parábola do publicano. Jesus veio salvar “o que estava perdido”. Sua Igreja é uma casa-de-saúde. Seus prediletos são os pecadores, ou ao menos os que se reconhecem como tais. Na cruz, o primeiro santo canonizado é o bom ladrão. E daí por diante abundam as histórias em que os grandes pecadores interessam instantaneamente às almas de eleição. Santa Catarina correu a visitar o jovem Tuldo em seu cárcere, e recebeu sua cabeça decepada e seu sangue, gritando: “Io voglio!” Santa Teresinha do Menino Jesus teve seu primeiro protegido num assassino que mereceu pena de morte: por intercessão de suas fervorosas orações o pobre monstro humano, a dois passos do cadafalso, voltou-se bruscamente e beijou com lágrimas a cruz que um padre lhe oferecia.
Em todas essas histórias tem especial relevo a intercessão de Maria, refúgio dos pecadores".

Gustavo Corção. A Igreja do céu, Revista Permanência.