terça-feira, 16 de abril de 2019

AVE! MARIA!


Fagundes Varela (1841-1875)

A noite desce – lentas e tristes
Cobrem as sombras a serrania,
Calam-se as aves, choram os ventos,
Dizem os gênios: – Ave! Maria!

Na torre estreita de pobre templo
Ressoa o sino da freguesia,
Abrem-se as flores, Vesper desponta,
Cantam os anjos: – Ave! Maria!

No tosco alvergue de seus maiores,
Onde só reinam paz e alegria,
Entre os filhinhos o bom colono
Repete as vozes: – Ave! Maria!

E, longe, longe, na velha estrada,
Pára e saudades à pátria envia
Romeiro exausto que o céu contempla,
E fala aos ermos: – Ave! Maria!

Incerto nauta por feios mares,
Onde se estende névoa sombria,
Se encosta ao mastro, descobre a fronte,
Reza baixinho: – Ave! Maria!
Nas soledades, sem pão nem água,
Sem pouso e tenda, sem luz nem guia,
Triste mendigo, que as praças busca,
Curva-se e clama: – Ave! Maria!

Só nas alcovas, nas salas dúbias,
Nas longas mesas de longa orgia
Não diz o ímpio, não diz o avaro,
Não diz o ingrato: – Ave! Maria!

Ave! Maria! – No céu, na terra!
Luz da aliança! Doce harmonia!
Hora divina! Sublime estância!
Bendita sejas! – Ave! Maria!