Padre Altamira Gomes
de Paiva.
Intensos estudos se fazem para resolver os
mistérios das forças físicas; profundas meditações, para encontrar a chave dos
intrincados problemas da natureza; inteligências e energias humanas se empenham
na descoberta dos tesouros escondidos da matéria. Magnífico o resultado de
tantos suores! Surpreendentes o progresso no reino da matéria!
E para a alma? É lamentável a negligência!
Doloroso de ver o pouco interesse em conhecer as necessidades da pobre alma!
Nenhum cuidado para ajudá-la a conseguir o seu fim.
O mundo em tanto apreço, e a alma - abandonada;
sobressaltos pela saúde do corpo, e pela da alma - indiferença cruel; para os
caprichos e exigências da sociedade, multiplicam-se as solicitudes, e para a
vida da alma - apatia quase completa.
A moleza da educação moderna, que pouco a pouco,
mas eficazmente enfraquece os corações; ambiente mundo que invade, quase sem
obstáculos, o lar doméstico; o desuso dos sacramentos e o hábito de nunca
elevar uma prece ao trono de Deus; a participação dos espetáculos e cinemas, de
onde não raras vezes, os sentimentos nobres e retos saem gravemente feridos; as
leituras repletas de sútil veneno contra a fé e contra a pureza do coração -
tudo concorre para completar a ruína da alma. O abalo moral é forte!
A corrente das seduções, impetuosa! O triunfo da
carne e das paixões põe o homem fora de seu centro, obrigando-o a correr
perdidamente pela estrada do prazer.
Quem o conduzirá ao bom caminho? Quem
mostrar-lhe-á os perigos que o ameaçam, indicando-lhe ao mesmo tempo um meio
reparador? Será sempre a Santa Igreja. Adotando o remédio inculcado pelo Divino
Mestre, estabelece o tempo salutar da Quaresma; testemunha da decadência do
espírito cristão, abranda o primitivo rigor, na esperança de conservar e
fortificar o tênue fio de vida, que se romperia sob o influxo de uma tensão
mais forte.
Uma insignificância o que de nós exige a Igreja,
durante a quaresma: penitencia quase nula, privações mínimas, sacrifícios
limitadíssimos; e, contudo, encontramos mil pretextos para evitarmos a sua lei,
procuramos motivos para criticá-la e condená-la.
Desgostam-nos as pequenas dificuldades encerradas
no atual preceito do jejum e abstinência.
As páginas sagradas, tanto do velho como do novo
testamento, constantemente nos lembram a necessidade e a eficácia de prática
tão salutar, pela qual muitas vezes foram obtidos de Deus favores sem número
para os profetas e o perdão e misericórdia para grandes pecadores, como Davi e
os ninivitas.
É uma das leis mais claramente estabelecidas na
Sagrada Escritura: aqui lembrada qual meio eficaz para aplacar a ira de Deus
irritado pelos pecados; mais adiante sugerida para fortificar-nos na conquista
do céu; umas vezes proposta como freio de nossas paixões; outras vezes
prescrita para o conseguimento de nosso fim.
A Igreja apenas determinou o modo e o tempo de uma
lei formulada por Deus, nos livros santos, tão evidente e explicitamente.
Se os corações estivessem menos ofuscados pelo
fumo das paixões e vaidades, e as inteligências mais livres das trevas da
ignorância e da presunção, ver-se-ia melhor a prudência e sabedoria divinas que
dirigem a Santa Igreja nas suas determinações.
Ouçamos humildes a sua voz, e entreguemo-nos
generosos às santas práticas a quaresma; concedendo às nossas almas metade da dedicação
empregada para o bem-estar do corpo permitamos em favor do negócio de nossas
almas parte de tantas penas sofridas inutilmente na aquisição de tantas
frivolidades.
*****
*Artigo publicado no Jornal
A Cruz, n.12, de 22 de fevereiro de
1920.
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