terça-feira, 12 de junho de 2018

O HOMEM QUE É VERDADEIRAMENTE HOMEM


“O homem que é verdadeiramente homem, isto é, que não degradou as suas energias espirituais, e as manteve acesas como uma chama sagrada, este homem nunca hesita em face dos tremendos conflitos, das reações, das resistências, que a vida amarga lhe opõe. Enfrenta-os com decisão e coragem, porque vai armado do grande amor, que é o misterioso fervor íntimo dos criadores e dos heróis, da grande fé tranquila, que é a misteriosa certeza que têm os heróis e os criadores de que o espírito nasceu para destinos imortais. No caminho, há o sorvedouro da lascívia a atravessar, os abismos carnais da triste argila. É nesse sorvedouro que tomba sempre, para a degradação total, o ser que não é ser. O ser que é ser, porém contorna-os: vence-os sem ânsias e sem custo. E enquanto, em torno, os homens frágeis oscilam, batidos de ventos contrários de ambição e luxuria, ele fica sereno, num sorriso justo: sereno, porque sabe que a ale não o podem vencer os vendavais, e num sorriso justo porque compreende que haja os homens frágeis e lhes perdoa, porque a compreende, a fragilidade infinita. Que é que o sustenta nessa altitude firme e heroica? Que é que sustenta, em sua atitude, o gênio, os santos, os heróis? Uma força secreta, indefinível: ondas interiores de grandeza. O homem que é assim transforma em sabedoria, em bondade, em beleza - em realizações fecundas - as suas próprias dores, como sempre o fizeram os gênios, os santos, os heróis. E para esgotar-lhes, a essas dores, o veneno corrosivo, para quebrar-lhes o acento deprimente, ironiza-as, ri-se delas, "canta por entre as águas do dilúvio!".  
***** 
Tasso da SILVEIRA. Parnasianismo e simbolismo, A Ordem, n. 74, 1937, p. 56-57. (O trecho acima transcrito trata-se de análise do autor sobre o soneto "Sorriso interior", de Cruz e Souza).


Nenhum comentário:

Postar um comentário